
Continuando com a série, hoje vamos falar de Moliére este grande teatrólogo, que ridiculizava os maridos enganados, ou os que temiam ser, e que foi na realidade: um cornudo convicto.
"É uma verdade que os homens que se encontram acima dos demais, por seu talento, desses se aproximam, quase sempre, por suas fraquezas. Com efeito, por que razão, em virtude do seu talento, haveriam de pairar acima da humanidade?" (Voltaire).
Segundo Kock (1990), a observação de Voltarie não cabe inteiramente no caso de Moliére, por um detalhe: não foi por suas fraquezas, mas sim por suas tristezas, sofrimentos, que ele se aproximou da humanidade.
O primeiro amor do nosso herói foi Madalena Béjart, comediante que conheceu quando estreava nos palcos como ator. Neste período tal profissão não gozava de muito crédito social, mas era mais digna que a de prostituta. Ela era muito atraente, uma mulher livre (ela e sua família foram abandonados pelo pai) que vivia trocando de amantes, ao conhecer Moliére, tinha acabado de ser abandonada por um desses, que a deixara com uma criança para criar.
Ele apaixonou-se e ela o resistiu durante alguns meses, vangloriava-se por ter cedido favores apenas a gentis-homens e por isso lhe custava descer de posto, e, embora Moliére fosse quatro a cinco anos mais novo que ela, no seu entender ele não era suficientemente belo para ela. Após um tempo, terminou cedendo e admitiu tornar-se amante dele.
No entanto, ao término de alguns meses, retornou a vida de sair com homens da corte, que a atraiam muito. Moliére zangado, esbravejou com ela, sua resposta: "Que posso fazer, no entanto, se eu sou assim? Se sou louca por homens da corte! Eu o trai. Terminemos, já que lhe é intolerável a minha traição." Ele a perguntou, se a perdoasse se ela não faria mais, mas ela zombando da pergunta disse que se aconteceu um dia, não há razão para não acontecer novamente. Ele aceitou a situação e assim estava dada a permissão pra que ela o traísse quando bem entende-se.
Madalena não se privava de seus prazeres e por isso quase sempre sua filha, Armanda, ficava entregue a empregada, mas Moliére estava ali para tratar a criança como pai dedicado.
Durante quatro anos manteve-se ligado a Madalena, quando triste com os golpes que recebia dela, era na inocência de Armanda que se refugiava, ensinando-lhe: ler, escrever, além dos princípios de moral e virtude. Cansou-se de Madalena, quando estreava sua primeira peça regular, até então se limitava a apresentação de algumas farsas imitadas do teatro italiano. Conheceu outra atriz a senhorita De Brie, jovem e bonita, que mostrou-se uma ótima pessoa.
Mas... o nosso herói gostava da infidelidade, pois deixou De Brie, para casar-se com Armanda Béjart, a filha da primeira. Ao casar-se estava com quarenta anos e sua esposa ainda não tinha dezoito. O próprio Moliére traçou, mais tarde, o perfil de sua senhora, em uma cena da peça Burguês Gentilhomem:
"a personagem Lucila, filha de Jourdain, pela qual está apaixonado Cleonte, era vivida pela senhora Moliére. No correr da cena, Covielo, criado de Cleonte, enumera os vários defeitos de Lucila, afirmando que ela é medíocre, insensata, de olhos pequenos, boca grande, baixa estatura, indolente, sem espírito, caprichosa, até que Cleonte afirma que a odiará tanto quanto a amara." (KOCK, 1990, p. 147
Na época em que escreveu esta peça, Moliére já estava casado com Armanda a oito anos, isto é, oito anos que havia sido enganado e que era infeliz. E ao contrário do personagem Cleonte, ele prometia a si mesmo odiá-la, no entanto, não a deixava de amar.
Sintetizando a história, o casal teve três filhos, Armanda teve vários amantes, ao ser descoberta, uma vez, pelo marido, passou a ter conduta exemplar, mas logo retornou aos seus casos. Moliére continuou casado, apesar de tudo, infeliz e doente dos pulmões, somente fechou os olhos na companhia de sua senhora. Armanda teve um ato de revolta, que redimiu um pouco seus erros; ao ser informada que o arcebispo de Paris negava-se enterrar seu marido em terra santa, procurou este, proclamando aos brados suas amantes, argumentando não ter este moral para negar um enterro digno à Moliére, o arcebispo não cedeu, e ela retirou-se, indo até o rei reclamar justiça. Este garantiu a senhora Moliére o direito de enterrar seu marido como cristão.
Para solucionar o impasse com o bispo, o rei perguntou a este, até onde ia a terra santa, e ele respondeu até quatro pés de profundidade. O rei respondeu: " - Pois bem! Enterrem Moliére a cinco pés e todos ficarão satisfeitos!"
Por hora, os próximos textos versaram sobre outros temas, mas logo voltaremos a esta série.
Fonte: KOCK, H. Os cornudos. 2 ed. São Paulo: Paumape.
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